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TSE devolve mandato de Lisboa

Uma liminar concedida pelo ministro Dias Tóffoli, do Tribunal Superior Eleitoral, na tarde de hoje, devolveu o mandato cassado do deputado Wilson Lisboa.

Lisboa foi cassado pelo TRE por abuso do poder econômico. O suplente José Lobo (PC do B) já havia sido empossado no lugar dele.

Com a decisão do TSE, Lisboa volta ao cargo imediatamente.

Leia íntegra da decisão abaixo:

 

 

DECISÃO

Cuida-se de ação cautelar, com pedido de liminar, ajuizada por Wilson Ferreira Lisboa, deputado estadual eleito em 2010, objetivando a concessão de efeito suspensivo a recurso ordinário interposto de acórdão do Tribunal Regional Eleitoral do Amazonas (TRE/AM) que, julgando procedente representação ajuizada com base no art. 30-A da Lei nº 9.504/97, cassou o diploma do requerente, em razão da omissão de gastos na campanha com programa eleitoral e deslocamentos aéreos, a caracterizar “caixa-dois” (fls. 2-20).

Sustenta que, por tratar a hipótese de recurso ordinário, o juízo de admissibilidade pela Corte de origem é prescindível, nos termos do art. 277 do Código Eleitoral.

Alega que esta Corte tem admitido, em casos excepcionais, ação cautelar proposta para conferir efeito suspensivo a acórdão regional antes de o recurso aportar no TSE.

Noticia que o Presidente do Tribunal a quo, a despeito de o recurso ter sido interposto em 28.5.2012, sequer abriu vista para as contrarrazões do recorrido.

Afirma a existência de “um terceiro, José Freire de Souza Lobo, atravessando petição a dizer de sua posse na Assembléia Legislativa do Estado” (fl. 3).

Desse modo, alega ser desnecessária a espera pelo aporte do recurso ordinário nesta Corte para que seja conferido trânsito à cautelar.

Aduz que o recurso ordinário traz ao conhecimento deste Tribunal tudo o que foi debatido na origem, que pode ser assim sintetizado:

a) o TRE/AM afastou a preliminar de ilegitimidade ativa do Ministério Publico Eleitoral suscitada na contestação. Entretanto, nos termos do art. 30-A da Lei 9.504/97, apenas aos partidos e coligações é conferida legitimidade para representar à Justiça Eleitoral;

b) a representação foi julgada procedente em virtude da omissão de gastos de campanha relativos a passagens aéreas, produção de propaganda e utilização de imóvel, falhas essas que não constituem gravidade suficiente para a cassação de mandato;

c) a Corte Regional dissentiu da jurisprudência do TSE ao não aplicar o princípio da proporcionalidade no caso da representação por violação ao art. 30-A da Lei nº 9.504/97;

d) é fato incontroverso nos autos que o fretamento de aeronaves para os trechos Manaus/Nova Olinda/Novo Aripuanã/Manaus, no dia 14.7.2010, e Manaus/Fonte Boa, no dia 26.9.2010, foram de responsabilidade do PMDB, e não do requerente;

e) o TRE/AM partiu de premissas falsas ao concluir que o fretamento das aeronaves foi feito pelo requerente, uma vez que tal conclusão destoa da afirmação do próprio Parquet, no sentido de que a despesa foi realizada pelo PMDB e não declarada como doação na prestação de contas do candidato;

f) não tendo o ora requerente fretado a aeronave, em relação ao trecho Manaus/Novo Aripuanã/Nova Olinda/ Manaus, o valor a ser considerado seria o de R$ 480,00, somadas as passagens aérea e fluvial, e não o relativo ao custo total de fretamento no valor de R$ 7.000 (sete mil reais);

g) o imóvel cuja utilização não teria sido declarada na prestação de contas trata-se de bem cedido pela esposa do requerente, com custo estimado de R$ 2.000,00 (dois mil reais), o que foi devidamente informado na prestação de contas retificadora;

h) a Corte Regional incorreu em erro material ao concluir pela irregularidade na utilização de imóveis, quando na verdade se tratou de um único imóvel cedido pela esposa do requerente;

i) houve omissão na apreciação de argumentos relevantes para a solução da lide, consistentes na ausência de responsabilidade do requerente no fretamento de aeronave para viagem à Tabatinga no dia 19.8.2010, bem como na consideração do valor dos trechos, estimado em R$ 669,90, a ida, e R$ 489,90, a volta; e em relação aos custos com a produção da propaganda eleitoral gratuita, a cargo do PCdoB.

Noticia que o seu mandato já foi declarado extinto e que já tomou posse o então suplente, José Lobo.

Sustenta a presença do fumus boni juris diante da plausibilidade das razões recursais no que se refere à ilegitimidade ativa do Ministério Público, à fragilidade das provas e à negativa de vigência pelo Tribunal Regional ao princípio da proporcionalidade.

Defende o periculum in mora, tendo em vista que o tempo subtraído do seu mandato não mais poderá ser revertido.

Requer o deferimento da liminar, para conceder efeito suspensivo ao recurso ordinário até seu julgamento por esta Corte, com a determinação da recondução imediata do requerente ao seu cargo.

É o relatório.

Decido.

Vislumbro, em princípio, o fumus boni juris.

O ora requerente teve seu diploma cassado em sede de representação fundada no art. 30-A da Lei nº 9.504/97, em razão de irregularidades nos gastos de campanha, o que, segundo o Tribunal Regional, demonstraria a existência de “caixa 2” .

As irregularidades que ensejaram a procedência da ação consistiram na omissão na prestação de contas de informações relacionadas a gastos com transporte, com a produção de mídia na propaganda eleitoral e com a utilização de imóvel. Extraio os seguintes excertos do aresto recorrido (fl. 45):

A pretensão ministerial funda-se na alegação de que o Representado teria violado o disposto no art. 30-A da lei 9.504, praticando caixa 2, o que seria demonstrado pela omissão na prestação de contas da declaração de quaisquer gastos com transporte ou deslocamento ou ainda com a produção de programas de rádio, televisão ou vídeo, mesmo a despeito de ter sido constatada a ocorrência de deslocamentos para os municípios de nova Olinda, Fonte Boa e Tabatinga, onde há registros da participação do candidato em atos de campanha, bem como a participação do candidato em programas de veiculados no horário eleitoral gratuito.

O requerente alega que as passagens foram doadas pela Coligação Avança Amazonas, que os gastos com produção de mídia foram arcados pelo PCdoB e que o imóvel utilizado se trata de uma pequena casa de conjunto habitacional, de propriedade de sua esposa.

Ainda em relação às passagens aéreas, o requerente chama a atenção para o fato de que a nota fiscal foi emitida em nome do PMDB, não sendo viável, em razão disso, atribuir ao candidato o gasto total com a locação da aeronave, mas sim somente o relativo ao trecho por ele utilizado.

Sobre o fretamento das aeronaves, consignou o Tribunal Regional que o nome do requerente constou da lista de passageiros da Empresa Manaus Aerotáxi nos dias 14 de julho, 15 e 28 de agosto e 26 de setembro, ressaltando que o valor de apenas um dia de aluguel custou R$ 7.000,00 (sete mil reais), tendo sido emitida nota fiscal em nome do PMDB.

A esse respeito, a Corte de origem ressaltou a gravidade dos fatos, ainda que as despesas tenham sido realizadas pelo PMDB, o que apenas demonstraria, com mais veemência, a realização de inúmeros recursos não contabilizados na prestação de contas do candidato, ora requerente.

Concluiu o Tribunal a quo que “a omissão intencional na prestação de contas da campanha eleitoral acerca de despesas com deslocamento aéreo e produção de programa eleitoral caracteriza caixa dois e tem o condão de efetivamente desequilibrar a igualdade entre os candidatos, o que evidencia a proporcionalidade da cassação do diploma em relação à conduta praticada” (fl. 42).

Entendo, entretanto, que tal conclusão mereça ser melhor analisada por este Tribunal, especialmente por se tratar de cassação de diploma.

Ademais, sobre a incidência do art. 30-A da Lei das Eleições, já decidiu esta Corte que o vício de natureza insanável que enseja a rejeição das contas de campanha não necessariamente acarretará a perda do diploma do candidato, sendo “necessária a aferição da relevância jurídica do ilícito, uma vez que a cassação do mandato ou do diploma deve ser proporcional à gravidade da conduta e à lesão ao bem jurídico protegido pela norma” (RO nº 4443-44, DJE de 13.2.2012, rel. Min. Marcelo Ribeiro). No mesmo sentido, os seguintes precedentes: AgRgRO nº 255SP, DJE de 2.4.2012, relª Min. Nancy Andrighi; AgRgAI nº 11.991/MG, DJE de 22.3.2011, rel. Min. Arnaldo Versiani; RO nº 1.453/PA, DJE de 5.4.2010, rel. Min. Felix Fischer).

Ainda sobre a matéria, destaco, por esclarecedora, a ementa do seguinte julgado:

RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2006. SENADOR. REPRESENTAÇÃO. ARRECADAÇÃO E GASTO ILÍCITO DE CAMPANHA. OCORRÊNCIA. SANÇÃO. PROPORCIONALIDADE.

[…]

2. Na espécie, o candidato recorrido arrecadou recursos antes da abertura da conta bancária específica de campanha, bem como foi, no mínimo, conivente com o uso de CNPJ falso em material de propaganda eleitoral, além de não ter contabilizado em sua prestação de contas despesas com banners, minidoors e cartazes.

3. Para a aplicação da sanção de cassação do diploma pela prática de arrecadação e gastos ilícitos de recursos de campanha não basta a ocorrência da ilegalidade. Além da comprovação do ilícito, deve-se examinar a relevância do ato contrário à legislação ante o contexto da campanha do candidato. Precedentes.

4. Na hipótese dos autos, não obstante o caráter reprovável das condutas de responsabilidade do recorrido, verifica-se que o montante comprovado das irregularidades (R$ 21.643,58) constitui parcela de pouca significação no contexto da campanha do candidato, na qual se arrecadou R$ 1.336.500,00 e se gastou R$ 1.326.923,08. Logo, a cassação do mandato eletivo não guarda proporcionalidade com as condutas ilícitas praticadas pelo recorrido no contexto de sua campanha eleitoral, razão pela qual se deixa de aplicar a sanção do § 2º do art. 30-A da Lei 9.504/97.

5. Recurso ordinário não provido.

(Respe nº 28.448/AM, DJE de 10.5.2012, Rel. Min. Marco Aurélio, relatora designada Min. Nancy Andrighi)

Insta salientar que, a despeito de não possuírem os recursos eleitorais natureza suspensiva, por força do disposto no art. 257 do Código Eleitoral, há de se considerar que, na espécie, a execução imediata do julgado reclama juízo de ponderação, haja vista a possibilidade de nova avaliação por esta Corte de todo o conjunto probatório dos autos, especialmente para efeito da análise da relevância jurídica do ilícito.

Ante o exposto, presentes os requisitos legais, defiro a liminar pleiteada para conceder efeito suspensivo ao recurso ordinário interposto por Wilson Ferreira Lisboa, determinando o seu retorno ao cargo de deputado estadual, até o julgamento do recurso por esta Corte.

Comunique-se, com urgência, ao Tribunal Regional Eleitoral do Amazonas.

Cite-se.

Publique-se.

Brasília, 19 de junho de 2012.

Ministro Dias Toffoli, relator.

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