Esportes

Luxa além do futebol: técnico do Palmeiras sonha ser influenciador digital e diz que “detesta” séries

Por Fabricio Crepaldi e Felipe Zito — São Paulo

Redes sociais, pandemia e outros pensamentos da quarentena de Vanderlei Luxemburgo

A rotina de Vanderlei Luxemburgo durante a quarentena é quase como a de uma pessoa comum. Passou a assistir mais filmes e ler mais livros. As redes sociais também são um aliado importante para passar o tempo. Só as séries, cada vez mais populares, que ele diz “detestar”.

Mas o treinador também aproveita o isolamento para estudar o futebol, trabalhar e projetar a volta do Palmeiras, ainda sem data para acontecer.

Tudo de maneira virtual. Treinos, entrevistas, reunião com comissão técnica, jogadores, diretoria… Situações que não chegam a ser novidade para ele. O Luxemburgo versão 2020 é tecnológico, antenado às novidades da internet.

Tem usado as redes sociais para muitas funções: transmissões ao vivo, opiniões pessoais, contato direto com o torcedor, divulgar o trabalho no Palmeiras e até ensinar como cozinhar.

 É justamente nessa área da comunicação e da internet que Luxa vê seu futuro, segundo ele mesmo diz. O “Canal do Luxa” já existe nas redes, mas ele quer transformar isso em algo muito maior quando chegar a hora da aposentadoria. Provavelmente, isso ainda vai demorar um pouco para acontecer.

Aos 68 anos, ele nem pensa em encerrar a carreira.

– Importante é que tenho saúde, com 68 anos, estou me prevenindo. Todos temos que estar nos preservando. Tenho saúde, estou sempre atento, ativo, enquanto estiver com essa vontade toda, vou continuar trabalhando com ela apontada pro céu. Quando ela ficar sonsa, aí acabou (risos) – explicou.

Nessa entrevista, Vanderlei Luxemburgo falou sobre muitos assuntos fora do futebol. Como tem lidado com a pandemia, a situação do Brasil, o racismo no mundo e no futebol, a atuação nas redes sociais e muito mais.

Vanderlei Luxemburgo retornou ao Palmeiras no início deste ano — Foto: Marcos Ribolli

Vanderlei Luxemburgo retornou ao Palmeiras no início deste ano — Foto: Marcos Ribolli

Confira abaixo o papo completo com o treinador:

GloboEsporte.com: o que você tem feito nessa quarentena?
Vanderlei Luxemburgo:
 – Procurado ver futebol, analisando bastante coisas que eu já fiz, principalmente na análise recente do Palmeiras. Analisando o futebol, vendo alguns jogos recentes, dinâmica de jogo, as equipes que ganharam campeonato, como que atuaram. Lendo… Minha filha estava em Marília, com o Fabiano, ficava na casa dela metade e metade aqui. Agora ela chegou. Ela vem pra cá, sai do carro, sobe no apartamento e fica todo mundo aqui. Preocupação só com elevador, com a máscara, proteção, esse negócio todo. Fica contando passo a passo da cozinha para o quarto, da sala para o quarto.

Aumentou muito o seu contato com a família, que é algo raro no dia a dia do futebol?
– No início você está meio desacostumado. Quase nunca almoça e janta em casa. Agora você reúne, bate o papo, conversa. Muitas coisas foram fugindo ao longo do tempo e estão retornando agora. Muitas coisas que deixamos de fazer por causa da profissão, de uma série de coisas, juntou de novo. Conviver com a família é muito legal. É ruim pela pandemia, mas aproximou bastante a gente de novo. Sempre fomos muito juntos.

O que você começou a fazer mais nessa quarentena? Passou a ver mais séries, por exemplo?
– Detesto série. Vejo futebol na televisão. Não gosto de série de jeito nenhum, não me acostumo. Prende muito você, deixa de fazer coisas interessantes. Gosto de ver um bom filme, que inicia e termina. Li bastante, é legal. Ligar para um amigo e para outro, contato nos grupos de WhatsApp, falando com quem você não vê há tanto tempo, criando rotinas diferentes.

Por falar no WhatsApp, há muitas figurinhas com a sua imagem no aplicativo. As pessoas te mandam essas figurinhas?
– Mandam, me sacaneando às vezes. Eu não ligo, mando de volta algumas coisas bem interessantes e sacaneando os amigos também… Tem no Instagram também, entro muito para ver as pessoas atuando. Gosto de responder as pessoas, é legal as pessoas saberem que é você. Uns pegam pesado, outros são mais leves.

Até uma live com perguntas de torcedores você disse que vai fazer…
– Vai chegar a 300 mil seguidores, vou fazer essa live. Serão perguntas totalmente diferentes. Vão ser aquelas cabeludas que não estamos acostumados a ser perguntados, “por que não tem coragem de colocar esse, se o presidente que manda escalar”… Vai ser meio doido (risos). Mas vou fazer, não tem problema comigo.

Por que você decidiu ser mais participativo nas redes sociais?
– Estou mantendo. Venho com isso há muitos anos. Quando surgiu o Twitter, fui o primeiro a ter. Fiz contrato com uma empresa de análise de desempenho, da Folha, que fazia scout. Fazia muita palestra com universitários, de jornalismo, para ter a troca do profissional com formandos. A tecnologia hoje me permite ir de outra maneira. Sempre fui ligado nessas coisas de novidade.

– Estar ligado no Instagram e no canal são coisas legais. Só não uso mais porque estou trabalhando. Me limita muito a ter opiniões que gostaria de ter que não posso ter nesse momento. Estou trabalhando e tem algumas coisas envolvidas com a minha opinião. Quando eu parar, vou associar a televisão que eu tenho lá no Tocantins ao canal e fazer matérias importantes, vou divulgar muito com os torcedores em geral.

– Tenho uma penetração na torcida brasileira. Vou fazer como se fosse um canal de televisão. Vai ser bem diferente. Vai ser o Vanderlei Luxemburgo escrevendo um livro através do meu canal. Vou falar da minha vida pessoal, a biografia do Luxemburgo através do canal. Vou falando a minha biografia, da parte técnica, tática, da formação elenco, montagem de equipe… Olha o conteúdo. Tende a ser um canal bom. Com a televisão que tenho por trás.

Luxemburgo participa de campanha para homenagear profissionais da saúde no Brasil — Foto: Divulgação

Podemos ter um Luxemburgo influenciador digital no futuro? Seu futuro é na área de comunicação?
– Já fiz algumas experiências na Fox, no SporTV… Quero um estúdio para receber pessoas em uma mesa redonda, receber convidados, onde possa funcionar como canal de YouTube, mas como se fosse TV com toda estrutura por trás me amparando e dando sustentação. Já tenho esses profissionais, sem eles não vou conseguir nada, eles serão muito importantes.

Quando você diz que às vezes não dá uma opinião, é por carregar a imagem do Palmeiras ou pelo cenário atual do país?
– Vocês me conhecem. Se tivesse de fazer qualquer comentário político nesse momento eu faria. Minha vida pessoal, se opinião democrática, sempre vai existir, não posso ser cerceado disso. Mas não vejo momento político no Brasil. Não quero falar de política se não vejo isso. Vejo o problema do mundo e do Brasil como a pandemia. Tem de fazer com que pare de morrer pessoas. Não tem que falar de política, é o que menos interessa agora.

– Vamos falar de quê, como fazer para morrer menos pessoas? Vamos buscar soluções para isso. Falar de política vai fazer com que morram menos pessoas? Temos de falar daquilo que vai fazer com que morram menos pessoas. Vejo as pessoas discutindo política… Momento não é político, é de arrumar solução para que a pandemia acabe. Arrumar vacina, mais leitos… Todo mundo sabe o meu pensamento político, todo mundo conhece, mas não vejo motivo de falar agora sobre política, ela só atrapalha. Não ajuda nada. Por isso não falo, não é o Palmeiras que me proíbe de falar disso.

– Não interessa falar de política. Me interessa de falar de gestão de crises, de ter ideia de ter alocado hotéis que estão falidos para fazer leitos de UTIs, leitos para receber médicos e enfermeiros para salvar vida das pessoas, fazer isolamento. Por que não tiveram essa ideia? É coisa de gestão de crise, não de política. Vamos falar como gerir a crise. Você vê o governo como empresa. Onde está o problema, na saúde? Ali que vou gerir a crise. Não cabe a política nesse momento.

Mas isso que você está sugerindo não teria que partir dos políticos? Ou dá pra separar as questões?
– Essa é a opinião do cidadão. Jogador é cidadão, você é cidadão… Você tem direito de externar a opinião. Não quero entrar nisso de o governo tinha quer isso ou aquilo. Não estou entrando nesse mérito. Estou falando do cidadão Vanderlei Luxemburgo, do que ele acha que deveria ser feito com a pandemia, como penso que deveria ser tratado. Esse é o mal que está matando as pessoas.

– O técnico não vai juntar problema de nada. Pode colaborar, contribuir com aparição pública, participando de live que vai trazer benefício e ajudando pessoas. De outra maneira não posso contribuir. Entrar para discussão política, partidária, democracia ou não, não tem nada a ver nesse momento, temos que falar da pandemia. É a parte como eu penso como deveria ser tratado no mundo.

Você sempre foi muito ligado à política. Tem se afastado desse assuntos nos últimos tempos?
– Quero entender por que está me levando para o lado político, não estou entendendo… Sempre me posicionei, não houve necessidade de me posicionar. Pega todo o retrospecto, vai ver que me posicionei sempre, em tudo. Só que agora que o problema é que quando você tem um lado, uma ideologia, não torce contra o outro que está no lugar. Você quer que dê certo.

– Quero que o Brasil resolva o problema do Brasil. Eu não sou político, eu falo sobre a política. Não vou resolver porque não estou lá no governo. Mas me posicionar, eu posso me posicionar. Torço para que as soluções cheguem através de qualquer governo. Resolver os nossos problemas está ótimo para nós. O problema no Brasil vai ser resolvido para os meus bisnetos, aí vamos ter um Brasil mais equilibrado.

Como você vê essa questão do racismo no mundo? Recentemente você deu uma declaração que gerou polêmica sobre isso…
– A declaração depende muito de como se coloca, por isso gosto de dar entrevista ao vivo, não pode editar. O que eu falei foi que sou totalmente contra o racismo. Não tem que existir. Minha filha foi casada com negro, tenho uma neta que é mistura. Não tenho nenhum problema, o Márcio que trabalha comigo é negro. Não tenho nenhum problema com isso. Sou totalmente contra o racismo. E aquele ato do policial mostra o racismo puro, aquela atitude é racismo puro.

– O que quis dizer é que, na bola, o Pelé sempre foi chamado de negão. Não é racismo. Ele era chamado de negão na bola, a gente chamava todo mundo de negão. Isso não é racismo, isso que eu quis falar. Isso existe há anos. Quantas vezes você já não ouviram isso de “passa a bola, negão”. Isso que eu quis falar que não seja tratado como racismo. É uma bobagem ver isso em um treino e falar que chamou o outro de negão no treino. Racismo é algo diferente.

– No jogo de futebol, sair com a atitude de brigar, chamar o cara disso e daquilo, isso é atitude de racismo plena. Como eu que falei, pegaram… Morrem brancos e pretos equivocadamente. Achei legal nos Estados Unidos, nas passeatas, brancos e pretos juntos. Da mesma forma, morrem brancos e pretos. A vida é assim. A atitude do policial é racista. A atitude de outras é racista. A atitude no futebol, racistas já existiram, mas tem muitas que não são e as pessoas tratam como racismo. As pessoas entenderam de forma equivocada. Eu sou totalmente contra o racismo.

Você acha que existe muito racismo no futebol?
– Eu não vejo um racismo prático, atuado, da agressividade. Existe isoladamente, dentro do jogo, a provocação de o cara chegar e falar isso, é racismo. A provocação da arquibancada às vezes é para desestabilizar o adversário, com atos de racismo, aquele negócio, mas passa mais como uma provocação. Interpreta-se como racismo ou provocação, não sei.

– Tem a homofobia hoje, mas quantas vezes se fala desde antigamente? É uma discussão atual, forte, sobre homofobia, racismo, uma série de coisas. Essa discussão é ampla, tem de se discutir e chegar a um consenso, que eu acho que não vai chegar. Ela vai avançar por um longo tempo e não se chegará a um consenso sobre o que é ou o que não é.

Vanderlei Luxemburgo durante treino do Palmeiras — Foto: Cesar Greco / Ag Palmeiras

Vanderlei Luxemburgo durante treino do Palmeiras — Foto: Cesar Greco / Ag Palmeiras

Quais são seus planos para o futuro?
– Por ora, é Palmeiras. Tenho contrato de dois anos e estou focado totalmente no Palmeiras. Temos um elenco muito bom, que pode brigar por grandes conquistas, e esse é o nosso objetivo. Fazendo isso, fatalmente se dá sequência ao trabalho. É muito melhor do que trabalho novo. Se isso acontecer, não tem motivo para não continuar. Palmeiras é muito estruturado, era assim antes e hoje é totalmente, pode encarar qualquer adversário, montar grandes times e disputar títulos.

– Depois, posso encerrar a carreira no Palmeiras ou em outro lugar. Vai depender. Importante que tenho saúde, com 68 anos, estou me prevenindo. Todos temos que estar nos preservando. Tenho saúde, estou sempre atento, ativo, enquanto estiver com essa vontade toda, vou continuar trabalhando com ela apontada pro céu. Quando ela ficar sonsa, aí acabou (risos).

Qual o recado que você deixa para o torcedor no meio de tudo isso que estamos vivendo?
– Que essa pandemia não vai durar. Vamos torcer para que um gênio arrume uma vacina muito rápida. Isso é para o mundo ser vacinado e acabar com isso. Que sirva de exemplo, para que quem manda no mundo, os cientistas, os governos, separem muita verba para a ciência. A grande guerra no mundo será com a ciência. Teremos muitos vírus ainda pela frente que virão e esse será o grande embate. Tivemos vários vírus, veio esse, podem vir mais. O mundo tem que se preparar.

– Ao torcedor palmeirense, tenho que dizer que também estamos com saudade deles. A Mancha Verde fez um trabalho brilhante, arrecadou 90 toneladas de alimentos, eu ajudei com a campanha, foi um trabalho muito legal da parte deles. Ao sócio Avanti, que está sendo sacrificado, é o momento da colaboração. Assim como nós colaboramos com o clube, cedendo a nossa parte, o sócio Avanti, que já é privilegiado, o Palmeiras vai precisar dele, que continue pagando e se associando, vai ajudar muito. Essa fase ruim todos vão passar. Nós queremos o torcedor com a gente, mesmo que não esteja no estádio, mas com o pensamento positivo. O torcedor será muito importante, vou usá-los muito, de uma forma que não perceberão, mas continuarão sendo meu centroavante.

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