Justiça Estadual determina que Semsa flexibilize carga horária de servidora mãe de criança com deficiência

O Pleno do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM) negou provimento a uma Remessa Necessária em Mandado de Segurança e confirmou decisão de 1ª instância determinando que a Secretaria Municipal de Saúde (Semsa) assegure a flexibilização da carga horária trabalhista de uma servidora pública, mãe de criança com Transtorno do Especto Autista. Conforme laudo médico, a criança em questão demanda atenção e esforços concentrados por parte da mãe no sentido de prover a segurança e a estimulação necessária para seu desenvolvimento neurocognitivo.

O relator da Remessa Necessária (nº 0635346-79.2017.8.04.0001), desembargador João Mauro Bessa, na decisão, evidenciou a elevada probabilidade de agravamento do estado de saúde da criança e a necessidade da presença da mãe nas sessões de tratamento médico do filho. O voto do relator foi acompanhado unanimemente pelos desembargadores que compõem o Pleno do TJAM.

O caso

Na petição inicial do processo, a Autora da ação – uma Técnica em Enfermagem e servidora pública da Semsa – informa que tornou-se mãe de uma criança diagnosticada com Transtorno de Especto Autista (CID F 84.0) e requereu, judicialmente, a redução de sua carga horária sem a necessidade de compensação a fim de que esta possa prover a estimulação necessária para o desenvolvimento de seu filho, assim como para acompanhá-lo em sessões de tratamento médico.

Nos autos, os advogados da Autora informam que durante o período de sete meses em que lhe foi autorizada pela parte impetrada uma licença prêmio, seu filho apresentou melhorias significativas e frisaram que “retirá-la, nesse momento, do acompanhamento do tratamento do menor, gerará retrocesso do desenvolvimento deste”.

Os advogados da Autora acrescentam, nos autos, que o pedido de redução da jornada de trabalho foi parcialmente deferido pela autoridade impetrada tendo a redução pretendida sido condicionada à compensação da carga horária, o que em seu entender é uma resposta prejudicial, sendo “inviável ao acompanhamento materno da criança especial”, diz os autos.

Em 1ª instância, o Juízo da 2ª Vara da Fazenda Pública Municipal e de Crimes contra a Ordem Tributária deferiu medida liminar determinando a redução da carga horária da Autora de seis para quatro horas sem a necessidade de compensação. A parte impetrada, por meio da Procuradoria Geral do Município (PGM), recorreu da decisão sob a argumentação de que “a liminar não deveria ser concedida, visto que contraria toda a legislação aplicável à espécie”.

Decisão

O relator da Remessa Necessária, desembargador João Mauro Bessa, em seu voto, negou provimento ao recurso e salientou que embora reconheça-se o regramento contido nos artigos 3º do Decreto Municipal nº 8.962/2006 e no artigo 3º, § 1º da Instrução Normativa nº 001/2006-GS/SEMPLAD – os quais permitem a redução da carga horária desde que efetuada compensação de horário – “não se pode olvidar das normas constitucionais aplicáveis ao caso, mormente o princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III da Constituição Federal) e o dever do ente municipal de cuidar da saúde e assistência pública, proteção e garantia das pessoas com deficiência (art. 23, II da Constituição Federal). Importa ainda mencionar o teor do § 2º do artigo 5º da Constituição da República, segundo o qual ‘os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil faça parte’”, citou.

Lembra o relator, em seu voto, que “necessário se faz observar as disposições constantes da Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, notadamente do seu art. 7º, que estabelece que ‘os Estados Partes tomarão todas as medidas necessárias para assegurar ‘as crianças com deficiência o pleno exercício de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais  em igualdade de oportunidades com as demais crianças’”, apontou o magistrado.

O desembargador João Mauro Bessa, por fim, sustentou seu voto em jurisprudências – tais quais, o Agravo nº 07007847.2017.8.07.0000 julgado pelo TJ/DFT; a Apelação nº 0800660.2016.4.05.8308 julgada pelo TRF/5 e o Recurso Inominado nº 0000766-13.2016.8.16.0110 julgado pelo TJPR –  e negou provimento à presente Remessa Necessária consignando que “as normas constitucionais que dispensam especial proteção à família e aos portadores de deficiência se sobrepõem à discricionariedade da Administração Pública, em harmonia com o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, com direito à vida e à saúde, bem como o exercício pleno de direitos e liberdades fundamentais”, concluiu o magistrado em seu voto.

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