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MPF quer elaboração de novo programa de trabalho em contrato de gestão do Hospital Delphina Aziz

Contrato firmado com organização social para gestão da UPA Campos Salles e do Hospital Delphina Aziz, referência no atendimento a casos de covid-19 no estado, apresenta irregularidades que comprometem a fiscalização dos recursos públicos

O Ministério Público Federal (MPF) apresentou ação civil pública à Justiça Federal para que seja elaborado um novo programa de trabalho no contrato firmado entre o Estado do Amazonas e o Instituto Nacional de Desenvolvimento Social e Humano (INDSH) para gestão de duas unidades de saúde em Manaus. São elas, a Unidade de Pronto-Atendimento (UPA) Campos Salles e Hospital Delphina Aziz, unidade de referência no atendimento a casos de covid-19 no estado.

O contrato foi firmado em março de 2019 com o INDSH e previa o pagamento por meio de uma metodologia composta de uma parte fixa, correspondente a 90% do valor, e outra variável, referente aos outros 10% dos valores mensais, calculada a partir do atingimento de metas de qualidade.

De acordo com a metodologia, o INDSH receberia o valor mensal de R$ 8.451.349 na primeira fase de implantação, prevista para abril de 2019. Em maio do mesmo ano, na segunda fase, o valor seria R$ 11.624.454; na terceira R$ 14.655.952,00, com previsão de execução em junho de 2019; e na quarta R$ 15.625.450,00, prevista para os meses seguintes.

O cronograma de execução previsto não foi executado e, ainda assim, foram assinados aditivos ao contrato, alterando os prazos de execução. Um dos aditivos, firmado em abril de 2020 e que indicou o Hospital Delphina Aziz como unidade de referência no enfrentamento à pandemia, elevou o pagamento mensal para R$ 16.919.822,78, mais que o dobro do estipulado para a primeira fase de implantação, que não chegou a ser concluída.

O MPF destaca que, apesar dos aditivos, o núcleo do programa de trabalho, que continha as projeções dos serviços a serem prestados, não foi modificado. Este mesmo programa teve graves vícios identificados pela Controladoria-Geral da União (CGU), que classificou o documento como genérico e impreciso, e pela própria Secretaria de Estado de Saúde (SES) desde a contratação original, realizada em março de 2019. “Na elaboração do contrato de gestão, as disposições acerca do programa de trabalho devem guiar-se pela eficiência e técnica administrativas, especialmente quando se trata de execução de serviços da área de saúde que devem, precipuamente, ser prestados de forma direta pela administração pública. Sem um eficiente e detalhado programa de trabalho, haverá sério prejuízo à fiscalização da execução do contrato de gestão”, explica o MPF, na ação civil pública.

Em ofício apresentado à SES, o próprio INDSH reconhece que o programa de trabalho era deficitário e que era apenas uma proposta, tendo sido surpreendido ao ver que o documento, daquela forma incompleta, foi incluído como anexo do contrato de gestão.

Pagamentos sem fiscalização – Desde o início da vigência do contrato, nunca foi realizado o controle efetivo da execução do objeto. O modelo de fiscalização previsto funcionaria a partir da análise de relatórios trimestrais e semestrais que deveriam ser produzidos por uma comissão específica, que mediria o alcance das metas estabelecidas. “Na prática, a Comissão de Avaliação de Cumprimento do Contrato apenas atesta as notas fiscais emitidas pelo INDHS, sem avaliar o real cumprimento dos serviços contratados, postergando a análise das contas para ajustes futuros”, afirma o MPF.

Depoimentos de testemunhas ao MPF em julho de 2020 apontaram que um único relatório trimestral foi elaborado em mais de um ano e quatro meses de execução do contrato, mantendo os pagamentos mensais de forma integral, sem que seja realizado o efetivo controle da execução do ajuste.

Questionado pelo MPF, o secretário estadual de Saúde, Marcellus Campelo, confirmou que não há controle mensal da prestação de contas do contrato, que nunca houve glosa de valores – redução em pagamento de contrato quando o objeto não é cumprido na integralidade – em razão da impossibilidade de fixação de metas em virtude da pandemia de covid-19. Na ação civil pública, o MPF esclarece que, apesar da aparente justificativa, a ausência de controle e fiscalização persiste desde o início da contratação, em 2019. “Em resumo, nesses dois anos de contrato, o INDHS recebeu, sem controle efetivo da administração pública estadual, a quantia de R$ 294.288.124,68”, declarou o MPF.

Novo programa de trabalho – Na ação civil pública, o MPF quer que a Justiça Federal determine, em caráter liminar, a elaboração de novo programa de trabalho para o contrato de gestão, pelo Estado do Amazonas e o INDHS. Em caso de descumprimento, o MPF pede a aplicação de multa diária e pessoal de R$ 5 mil ao secretário estadual de Saúde e ao representante do instituto, José Carlos Rizoli.

O programa de trabalho deve conter as ações e serviços de saúde que serão prestados pelo INDHS; as metas físicas e de qualificação para as ações e atividades propostas; indicadores que permitam medir a eficiência, eficácia, efetividade e economicidade dos serviços prestados; sistema de avaliação de metas; e teto financeiro mensal pactuado e sua variação de acordo com o cumprimento das metas.

A ação destaca ainda a necessidade de que o programa de trabalho inclua cláusulas que determinem a periodicidade para apresentação de relatórios contábeis e financeiros, relatórios referentes aos indicadores de qualidade estabelecidos para a unidade, relatório de custos, relatório de execução do contrato de gestão e relatórios de bens com permissão de uso com descrição do estado de conservação.

O MPF pede ainda que a Justiça determine ao Estado do Amazonas a comprovação da fiscalização mensal do contrato, com avaliação dos indicadores que devem constar do programa de trabalho e a indicação de eventuais deduções financeiras feitas nos valores pagos ao instituto em caso de execução parcial do serviço previsto.

A ação tramita sob o nº 1006626-21.2021.4.01.3200 na 3ª Vara Federal no Amazonas, onde aguarda julgamento.

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