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GP dos EUA: Chance do quinto título de Hamilton e o futuro da Ferrari em jogo

Por Livio Oricchio — Nice, França

Além da possibilidade de Lewis Hamilton, da Mercedes, poder ser campeão, o GP dos Estados Unidos, no fim de semana, reúne outras áreas de interesse. Podem não merecer tanta atenção dos fãs, mas têm grande importância para a competição. Um bom exemplo são as consequências de outro desempenho fraco da Ferrari para o futuro de alguns dos seus profissionais, notadamente o diretor Maurizio Arrivabene, já bastante questionado dentro do grupo.

A corrida no Circuito das Américas, em Austin, domingo, pode fazer de Hamilton outro piloto cinco vezes campeão do mundo. O único nesse patamar é o argentino Juan Manuel Fangio. Depois, Hamilton terá pela frente apenas Michael Schumacher, com sete títulos. O piloto inglês lidera o campeonato, depois de 17 etapas, com 331 pontos diante de 264 de Sebastian Vettel, da Ferrari.

O terceiro colocado, Valtteri Bottas, companheiro de Hamilton, com 207, está matematicamente fora da disputa. A diferença dele para Hamilton é de 124 pontos (331-207) e há em jogo nas quatro provas que restam do calendário 100 pontos (25×4). O vencedor recebe 25 pontos na F1. O parceiro de Vettel, o finlandês Kimi Raikkonen, é o quarto, com 196.

Se até agora ambos, em algumas ocasiões, receberam ordens para serem úteis a Hamilton e Vettel, no evento do Texas é de se esperar que Mercedes e Ferrari os coloquem ainda mais a serviço do time, em detrimento dos seus interesses pessoais. Portanto, dependendo do andamento da corrida, faz sentido esperarmos novas ordens de equipe no GP dos Estados Unidos.

Matemática do título

Não está tão difícil para Hamilton definir a conquista do seu quinto campeonato já domingo. Tem 67 pontos a mais de Vettel (331-264) e haverá em jogo, depois da prova em Austin, 75 pontos (25×3), das três restantes, México, dia 28, Brasil, 11 de novembro, e Abu Dhabi, 25. Hamilton precisa somar oito pontos a mais que Vettel para fazer a festa no Circuito da Américas, dentre os seus favoritos.

Com os oito pontos a mais, a diferença para ambos subiria dos atuais 67 pontos para 75, impossibilitando o alemão de superá-lo. Vettel poderia, no máximo, igualar Hamilton em número de pontos se vencesse as etapas da Cidade do México, São Paulo e Abu Dhabi, e o adversário não fizesse ponto algum. Mas aí entraria em cena o primeiro critério de desempate, o número de vitórias. Hamilton já ganhou nove vezes na temporada diante de apenas cinco de Vettel.

Várias combinações de resultados garantem a Hamilton os oito pontos a mais de Vettel para ser campeão domingo. Como o piloto da Mercedes vem de uma média altíssima de performance, com seis vitórias, sendo quatro nas últimas quatro etapas, e dois segundos lugares nas oito últimas, faz sentido imaginarmos Hamilton dentre os três primeiros no Texas.

Claro, se não tiver quebra do equipamento, envolver-se em um incidente ao longo das 56 voltas no espetacular traçado americano ou mesmo cometer um erro.

Hamilton está próximo do pentacampeonato — Foto: Getty ImagesHamilton está próximo do pentacampeonato — Foto: Getty Images

Hamilton está próximo do pentacampeonato — Foto: Getty Images

Se Hamilton vencer, Vettel tem necessariamente de ser segundo para estender a disputa do mundial até pelo menos a etapa do México. Com os 25 pontos da vitória, Hamilton iria a 356 (331+25). Se Vettel fosse terceiro e não segundo, por exemplo, somando 15 pontos, ficaria com 279 (264+15). A diferença entre os dois pilotos cresceria dos 67 pontos de hoje para 77 pontos, menos portanto dos 75 disponíveis nas três provas restantes.

Temos aí já uma combinação. Se Hamilton vencer, Vettel tem de necessariamente ser segundo para manter a disputa matematicamente aberta.

Na hipótese de Hamilton receber a bandeirada em segundo, Vettel terá de ser no mínimo o quarto colocado para o campeonato não acabar. Com os 18 pontos do segundo lugar, Hamilton atingiria 349 (331+18). Vettel, com os 12 do quarto lugar, 276 (264+12). A diferença entre os dois ficaria em 73 pontos (349-276), abaixo dos 75 em jogo.

Agora se Hamilton terminar o GP dos Estados Unidos em terceiro. Para Vettel não ver a luta acabar precisa ser, no mínimo, o sexto colocado. Os 15 pontos do terceiro lugar levariam Hamilton a 346 (331+15). Vettel, com os oito do sexto, a 272 (264+8). A diferença entre o piloto da Mercedes e o da Ferrari seria de 74 pontos (346-272), hipoteticamente ainda possível para Vettel vencer o campeonato com três vitórias seguidas e nenhum ponto de Hamilton.

Essas são apenas três possíveis combinações de resultados que conduzem o melhor piloto do ano na F1, por consenso, Hamilton, a conquistar o seu quinto título. Há várias outras.

Empatia com a pista

Ah, coloque ainda na balança os efeitos da mencionada empatia de Hamilton com os seletivos 5.513 metros do traçado de 20 curvas e uma longa reta do Circuito da Américas. No ano passado, depois de estabelecer a pole position, Hamilton falou sobre o autódromo:

– Sua pista tem um pouco do melhor de cada uma das minhas favoritas, Spa, Suzuka, Turquia. É difícil descrever a sensação de contornar os “esses” de alta velocidade, em especial com esses carros. (Os modelos de 2017 foram os primeiros do novo regulamento, com chassi e pneus mais largos e bem mais rápidos nas curvas).

Lewis tem histórico favorável na pista americana — Foto: Getty ImagesLewis tem histórico favorável na pista americana — Foto: Getty Images

Lewis tem histórico favorável na pista americana — Foto: Getty Images

Sabe o resultado dessa paixão? Hamilton só não venceu a edição de 2013 das seis disputadas em Austin. Isso mesmo, Hamilton ganhou cinco vezes no Circuito das Américas, sendo quatro nos últimos quatro anos, tenho também largado na pole position em 2016 e 2017.

O que fica evidente da representativa vantagem de 67 pontos de Hamilton para Vettel é a elevada possibilidade de o mundial ser definido já nos Estados Unidos, como no terceiro de Hamilton, em 2015, ou no GP seguinte, no México, tomando-se por base a média de pontos dele e de Vettel a partir do GP da Grã-Bretanha, dia 8 de julho, décimo do calendário. Nessas oito provas, Hamilton somou 186 pontos, média de 23,25, e Vettel, 118, média de 14,75.

Mundial de equipes, no mínimo até o GP do México

Já o mundial de construtores não tem como acabar no Texas. A Mercedes também está na frente da Ferrari, primeira e segunda colocadas, 538 a 460. A terceira, RBR, encontra-se distante, 319 pontos. A cada etapa um time pode somar no máximo 43 pontos, dos 25 da vitória e 18 do segundo lugar. Nesse momento a vantagem da Mercedes é de 78 pontos (538-460).

Depois do GP dos Estados Unidos, haverá em jogo nas três corridas finais 129 pontos (43×3). A escuderia alemã precisaria aumentar a diferença para a Ferrari dos atuais 78 pontos para 129, não possível. Com uma dobradinha, primeira e segunda colocação, com seus pilotos, a Mercedes chegaria a 581 pontos (538+43).

Mercedes e Ferrari seguem na briga pelo título entre os construtores — Foto: Getty ImagesMercedes e Ferrari seguem na briga pelo título entre os construtores — Foto: Getty Images

Mercedes e Ferrari seguem na briga pelo título entre os construtores — Foto: Getty Images

Mesmo se a Ferrari não marcar ponto algum, permanecer com os 460, a diferença entre as duas, 121 pontos (581-460), não define o título para os alemães, é menor dos 129 necessários. A definição do mundial de construtores tende a se estender para um pouco mais longe na temporada.

Só lembrando que a Mercedes vem de quatro títulos seguidos na disputa entre os pilotos, três com Hamilton e um com Nico Rosberg, e quatro entre as equipes, hegemonia total na F1 desde a introdução da tecnologia híbrida, em 2014.

Ferrari, razões da queda

A Ferrari foi uma entre o GP de abertura do campeonato, dia 25 de março em Melbourne, Austrália, e o de Mônaco, sexto, 27 de maio. Outra, ainda melhor, entre o do Canadá, sétimo do calendário, dia 10 de junho, e o da Bélgica, 13º, dia 26 de agosto. A partir do seguinte, Itália, até o último, Japão, o 17º, dia 7, caiu significativamente de rendimento.

Qual o fato novo que podemos relacionar com a importante e inesperada queda? A FIA acatou novos pedidos da direção da Mercedes e Renault para controlar o sistema de recuperação de energia cinética, MGU-K, da unidade motriz Ferrari. Havia a suspeita de que disponibilizasse a Vettel e Raikkonen mais dos 160 cavalos permitidos por volta.

Primeiro foi Arrivabene a afirmar não haver relação entre a introdução de mais um sensor para controlar o seu MGU-K, por parte dos comissários da FIA, e Vettel ver Hamilton se distanciar na classificação. Logo em seguida foi a vez de o delegado para a F1 da entidade, Charlie Whiting, dizer que não foi por causa de o MGU-K estar agora sendo monitorado mais criteriosamente que a Ferrari não acompanha mais a Mercedes.

Óbvio, tanto um lado quanto o outro jamais poderiam admitir a existência de uma relação entre uma coisa e outra. Seria reconhecer o que se passava. No meio da F1 o tema virou motivo até de sarcasmos. Na Rússia, tanto Hamilton como o diretor da Mercedes, Toto Wolff, foram satíricos. Hamilton falou para os jornalistas, fazendo cara de inocente e ele mesmo rindo:

– Eu não sei por qual razão Sebastian, a Ferrari perdeu rendimento, eles não estão mais nos pressionando.

Wolff, também em Sochi, e como Hamilton provocando risos na imprensa:

– Eles (Ferrari) ainda tem a melhor unidade motriz, mas já não é mais como antes, quando não conseguíamos acompanhá-los. Eu não sei o porquê.

Ferrari teve queda drástica a partir do GP da Itália — Foto: ReutersFerrari teve queda drástica a partir do GP da Itália — Foto: Reuters

Ferrari teve queda drástica a partir do GP da Itália — Foto: Reuters

Com mais potência que a Mercedes, Renault e Honda, os engenheiros coordenados por Mattia Binotto, diretor técnico da Ferrari, podiam adotar acertos aerodinâmicos de maior carga. Com eles, os pilotos eram mais velozes nas curvas, exploravam melhor os pneus, sem prejuízo das velocidades nas retas. Resultado: o modelo SF71H italiano era impressionantemente rápido e equilibrado. Isso ficou mais evidente a partir da estreia da segunda versão da unidade motriz da Ferrari, em Montreal.

A partir do GP da Itália, 14º, dia 2 de setembro, primeiro do controle mais severo do MGU-K da Ferrari, Vettel e Raikkonen passaram a ser mais lentos em todos os parâmetros em relação a Hamilton e Bottas, velocidade nas curvas e nas retas.

Nas quatro corridas disputas desde então, Monza, na Itália, Marina Bay, em Singapura, Sochi, na Rússia, e Suzuka, no Japão, a Ferrari somou 100 pontos. A Mercedes, 163. A diferença no mundial de construtores entre Mercedes e Ferrari até o GP da Bélgica, etapa anterior a de Monza, portanto até a FIA ainda não controlar, como agora, o MGU-K da Ferrari, era de 15 pontos apenas. Mercedes estava em primeiro, com 375 pontos, e a Ferrari em segundo, 360.

Hoje, depois de a FIA rever o monitoramento do MGU-K, a Mercedes lidera, como mencionado, com 538 pontos, seguida da Ferrari, 460, ou seja, diferença de 78 pontos, bem diferente dos 15 pontos verificados até antes do controle do MGU-K.

Some-se a isso o impressionante desenvolvimento promovido pela Mercedes no seu modelo W09, coordenado pelo diretor técnico James Allison e o responsável pela aerodinâmica, Geoff Willis, resultado de “um trabalho exaustivo”, como disse Wolff, e um investimento sem precedentes do time alemão.

São os elementos acima descritos que levaram poucos a acreditar na versão de Arrivabene e Whiting para a súbita menor competitividade da Ferrari. Como não poderia deixar de ser, garantem estar associada a outros fatores, como a também repentina incapacidade de explorar os pneus Pirelli, e não ao maior controle do MGU-K.

Problemas de gestão

Mas independente de a Ferrari estar na frente da Mercedes, como vimos em vários GPs este ano, ou atrás, a exemplo de nas últimas etapas, a gestão do time não tem sido muito eficiente. Há erros crassos, vistos por todos, como na estratégia para Vettel e Raikkonen em Suzuka, na sessão de classificação, ao mandá-los para a pista com pneus intermediários e não lisos, os mais indicados e escolhidos por todos os demais no Q3.

Mais: deixar Raikkonen sem gasolina para usar o segundo jogo de pneus no Q3 no circuito onde ele mais rende, Spa-Francorchamps. Ainda: não realizar o jogo de equipe em Monza, permitindo a Raikkonen disputar a freada da primeira chicane com Vettel, quando lutavam pelo primeiro lugar depois da largada.

Ao sair mais lento do que poderia por tirar o pé do acelerador para não colidir com o companheiro, Vettel tornou-se mais vulnerável à tentativa de ultrapassagem de Hamilton na chicane seguinte, como acabou acontecendo. Ao procurar se defender, Vettel de novo se perdeu emocionalmente e tocou sua Ferrari na lateral da Mercedes de Hamilton. Rodou e caiu para as últimas colocações.

O novo presidente da Ferrari, John Elkaan, ouviu do ex-presidente, Sérgio Marchionne, falecido dia 25 de julho, que Arrivabene não se mostrou o líder que imaginava para a equipe. Iria substituí-lo no fim do ano. O meio sabe disso através de pessoas muito bem informadas sobre as coisas da Ferrari.

Maurizio Arrivabene: pressionado — Foto: Getty ImagesMaurizio Arrivabene: pressionado — Foto: Getty Images

Maurizio Arrivabene: pressionado — Foto: Getty Images

Como Elkann tem seguido com rigor as diretrizes prévias de Marchionne, a exemplo de levar Charles Leclerc para o lugar de Raikkonen, na Ferrari, e o italiano Antonio Giovinazzi para a Sauber, é bem possível que a troca de Arrivabene também esteja nos planos.

As quatro etapas a serem disputadas ainda este ano, a começar pela de Austin, podem estar sendo acompanhadas ainda mais de perto por Elkaan, que é norte-americano e italiano, neto do sócio majoritário do Grupo Fiat, Gianni Agnelli. O trabalho de Arrivabene, se o seu futuro já não foi definido, vai estar mais sob exame nessa fase final da temporada.

O raciocínio é simples: a Ferrari dispôs, este ano, como sempre, do melhor orçamento. Seu grupo técnico, apesar da juventude, demonstrou grande competência ao projetar e desenvolver um carro competitivo a ponto de, antes ainda da provável irregularidade no MGU-K, vencer a Mercedes. Prova da sua capacidade. Onde é, então, que a Ferrari está falhando para quase não mais estar na luta pelo título?

Resposta: gestão. Na pista, com o talentoso e tetracampeão Vettel, mas que este ano, mais de em outros campeonatos, cometeu vários erros comprometedores, e nos boxes e na sede da escuderia, em Maranello, responsabilidade de Arrivabene. Há quem associe parte dos equívocos de Vettel e a sua instabilidade inegável à falta de um verdadeiro líder com conhecimento de causa dentro da Ferrari.

Os treinos livres, a sessão de classificação e a corrida no Circuito das Américas vão oferecer mais elementos para Elkaan compreender, com maior clareza, o que deve ser o melhor para a Ferrari em 2019. A primeira sessão de treinos livres começa na sexta-feira ao meio dia, horário de Brasília.

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