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Ministério Público investiga gestora de presídios no Amazonas

Complexo Penitenciário Anísio Jobim, em Manaus, Amazonas (Foto: Divulgação/Governo do Amazonas)

A empresa Umanizzare, responsável pela gestão do Complexo Penitenciário Anísio Jobim, em Manaus (AM), onde ocorreu uma rebelião que terminou com 60 mortos entre domingo (1º) e segunda-feira (2), é investigada pelo Ministério Público do Estado (MP/AM). Um dos motivos que suscitaram investigação foi a suspeita de ausência de fiscalização em revista de presos no local.

Em seu site, a Umanizzare afirma que emprega no Anísio Jobim “diversas práticas e ações já desenvolvidas em outras unidades prisionais geridas por ela e que amenizam a condição de cárcere do detento”.

>> Governo deverá propor transferência de presos em Manaus para penitenciárias federais

Alerta sobre risco de rebeliões nos presídios de Manaus foi feita por peritos em  2016

Em janeiro de 2016, peritos da área de direitos humanos do governo federal produziram um relatório que já alertava para o risco de rebeliões em quatro presídios da capital amazonense.

Uma das conclusões foi de que os presos das penitenciárias da cidade de Manaus “basicamente se autogovernam nas unidades prisionais”. Os peritos avaliaram que essa situação afeta “o direito à vida”.

Em dezembro de 2015, quatro especialistas que compõem o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), grupo vinculado à Secretaria Nacional de Direitos Humanos (SDH), visitou quatro unidades prisionais do Amazonas: Centro de Detenção Provisória de Manaus (CDPM), a Penitenciária Feminina de Manaus (PFM), a Cadeia Pública Desembargador Raimundo Vidal Pessoa (CPDRVP) e o Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj).

Ao final da inspeção, a equipe identificou que todas as unidades “estavam sob um clima de grande inquietação” por conta da transferência de integrantes da facção criminosa Família do Norte (FDN), que estavam predominante nas penitenciárias locais, para os presídios federais.

“Com isso, foram feitos relatos sobre a possibilidade de rebeliões ou motins nas prisões dominadas pela FDN. Consequentemente, não só os funcionários e os presos desta facção pareceram bastante tensos, como também as pessoas privadas de liberdade não pertencentes à FDN”, explica um trecho do relatório.

O documento diz que os presídios masculinos no Amazonas são marcados “pela atuação das facções”, e ressaltou que além da FDN, também estão presos integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC).

“Os cárceres amazonenses estão divididos por facções, o que gera um contexto de fortes disputas e tensionamentos entre grupos no sistema penitenciário estadual”.

Na rebelião que ocorreu na última segunda-feira no Compaj, foram mortos presos ligados ao PCC e condenados por estupro. De acordo com o secretário de Segurança Pública do Amazonas (SSP/AM), Sérgio Fontes, a FDN comandou a rebelião. O motim foi considerado pelo governo estadual “o maior massacre” do sistema prisional do Amazonas.

O relatório do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura explica que a FDN domina grande parte dos cárceres estaduais, enquanto membros do PCC, em menor número, ficam dispersos nos chamados “seguros”.

Tratam-se de espaços separados e em condições piores, mas colocadas ali por agentes penitenciários para não amenizar o risco de serem assassinadas.

“Caso fiquem em contato com a massa carcerária, tais pessoas podem ser alvos de fortes represálias, correndo, assim, risco de morte. Nessa linha, várias pessoas isoladas relataram que os presos dos pavilhões possuem ferramentas capazes de quebrar as paredes das unidades que são, aparentemente, frágeis. Então, mesmo “isoladas”, sentem muito receio de estarem em locais de fácil acesso e, assim, serem torturadas e morrer nas mãos da massa carcerária. Esse temor se exacerba em situações de motins ou rebeliões”, diz o documento.

‘Péssimas condições’

O grupo também relata “péssimas condições infraestruturais” desses locais. O documento relata que os peritos visitaram um local onde os presos ficavam entre duas grades, anteriores a uma galeria, sem banheiro, camas e nem qualquer tipo de privacidade e segurança.

Segundo os especialistas, não se tratava de uma cela, mas de um espaço de passagem improvisado para abrigar tais presos ameaçados.

“Para fazerem suas necessidades fisiológicas, tinham de chamar o agente penitenciário para os levarem a um banheiro mais próximo. Foram observadas, também, nove pessoas praticamente amontoadas em uma cela com capacidade para apenas preso. Elas se revezavam para dormir e para realizar outras atividades, como tomar banho, se alimentar etc.”, afirma o relatório.

Falta de controle

Outro problema apontado é a falta de controle do Estado sobre as penitenciárias. A constatação é que os agentes penitenciários limitam seu trabalho a abrir e fechar as celas para o banho de sol. O restante da organização dos presídios é praticamente controlada pelos presos.

“A ação da administração penitenciária é limitada e omissa diante da ação das facções criminosas, de modo que o Estado não exerce sua função primária de monopólio legítimo da força, nem realiza efetivamente a sua tarefa de supervisão de execução penal […] Os presos das penitenciárias masculinas visitadas pelo MNPCT basicamente se autogovernam”, diz o relatório.

Acrescenta que os presos podem ser “extorquidos, ameaçados e inclusive, mortos pelos demais detentos. Por estar ausente, o Estado dificilmente conseguirá averiguar tais fatos devidamente”.

OAB cobra poder público

Em nota divulgada nesta segunda, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) afirmou que “o poder público precisa reassumir o controle das penitenciárias e dos presídios” que estão, na avaliação da entidade, “controlados por facções criminosas”.

“Cenas assim foram frequentes nos anos anteriores, no Maranhão, Pernambuco e Roraima. O Estado brasileiro precisa cumprir sua obrigação de resolver esse problema com a rapidez e a urgência necessárias, sem paliativos que somente mascaram a questão. O Poder Público precisa reassumir o controle das penitenciárias e dos presídios, atualmente controlados por facções criminosas”, diz a nota.

Em outro trecho da nota, a OAB também diz que a rebelião no presídio em Manaus registrou “ingredientes tristes de uma selvageria que parece não encontrar limites” que “confirmam que a brutalidade no sistema penitenciário brasileiro virou rotina”.

 

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