Leyla Yurtsever, advogada, articulista e professora
Alguns índices no Brasil são inglórios. Levantamento feito pela Serasa Experian em 2019 revelou que 63 milhões de brasileiros estão negativados em algum órgão de proteção ao crédito: SERASA, SPC ou CADIN. Esse contingente de inadimplentes é maior que a população de quase todos os países da America Latina. Seria o dobro da população do Peru e maior que da Colômbia. É um índice que aumenta a cada ano sem sinais de qualquer redução.
Afora os condicionantes econômicos que limitam o crédito, fazendo com que grande parte da população economicamente ativa esteja a margem da economia, tem-se ainda que muitos desses registros são gerados indevidamente. Ou seja, em alguns casos existe a negativação indevida o que pode ocasionar um dano moral.
A jurisprudência (decisão dos tribunais) é pacífica de que a negativação indevida é uma violação da dignidade, sendo considerada, neste caso, um dano moral. Estabelece o artigo 1º da Constituição Federal que a dignidade da pessoa é um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito. É, portanto, inviolável. Assim, qualquer ofensa a intimidade, a honra, a privacidade e a individualidade se constitui um ataque a direito personalíssimo com reparação indenizatória. Ressalte-se que, se trata de um dano presumido (in re ipsa) onde inexiste a necessidade de prova em relação ao dano, pois a própria ação lesiva, neste caso, a negativação indevida já reputa o consumidor como mau pagador.
Ainda que reprovável, a indenização de dano moral por negativação indevida obedece critérios de razoabilidade, onde deve ser observada a capacidade econômica do causador do dano, a intensidade e duração do dano experienciado pela vítima e suas condições sociais. O objetivo é que a indenização tenha um efeito pedagógico, onde a empresa possa corrigir suas ações e evitar novas ocorrências deste tipo.
Contudo, nem sempre a negativação indevida gera um dano moral com direito de reparação. A Súmula 385/2009 do Superior Tribunal de Justiça estabelece que a negativação indevida em cadastro de proteção ao crédito não gera indenização por dano moral, quando preexistir inclusão legítima. Ou seja, caso exista(m) outro(s) registro(s) o consumidor não pode alegar qualquer tipo de constrangimento ou lesão emocional/psicológica que mereça ser indenizada.
Outro aspecto é que indenização por dano moral não objetiva ser uma forma de acréscimo patrimonial, mas uma reparação pelos danos sofridos. Decorre assim, que tal indenização não pode ser tributada com imposto de renda, pois não se trata de ganho financeiro, mas compensação pelos males sofridos. Este é o entendimento da Súmula 498 do Superior Tribunal de Justiça.
Se, ser negativado de forma correta pela inadimplência já gera vários desconfortos, pois exige viver no ostracismo econômico, ter uma negativação indevida potencializa ainda mais os danos e abalos econômicos e emocionais.
Em um país de economia fragilizada como o Brasil, figurar no cadastro de bons pagadores significa status e troféu social, pois afinal o último bem de que dispõe o trabalhador é seu nome. E este, como parte indissociável da pessoa não pode ser lesado indevidamente.
Leyla Yurtsever é advogada, articulista e professora. Sócia e fundadora do escritório jurídico Leyla Yurtsever Advogados Associados. Graduada em Direito. Especialista em Direito do Trabalho e Previdenciário pelo Ciesa; e em Direito Penal e Processo Penal pela UFAM. É Mestre em Gestão e Auditoria Ambiental pela Universidad de Leon (2006) – Espanha. Doutoranda em Direito pela Universidade Católica de Santa – Fé – UCSF. Foi coordenadora do Curso de Especialização em Direito Eleitoral da Universidade do Estado do Amazonas e do Núcleo de Prática Jurídica, neste último atua ainda como professora. Palestrante convida da Escola Judiciária Eleitoral – EJE/ AM. Coordenou e lecionou no Escritório Jurídico da UNIP e no Núcleo de Advocacia Voluntária – NAV – da Uniniltonlins. Professora da Universidade Federal do Amazonas e subcoordenadora do Núcleo de Prática Jurídica da UFAM/Direito. Foi professora do curso de Segurança Pública da UEA e a primeira mulher a ser professora de uma disciplina militar denominada “Fundamentos Políticos Profissionais” no Comando-geral da Polícia Militar. Atualmente é Assessora Jurídica Institucional da Polícia Militar do Amazonas.