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Jonathan Azevedo: ‘No caminho até a praia as madames me viam e abraçavam as bolsas’

Capa da GQ de maio, nossa edição de aniversário, Jonathan Azevedo não esquece de onde veio – mas sabe para onde quer ir

Jonathan Azevedo (Foto: Pedro Dimitrow)

Jonathan Azevedo chegou para ficar. Ator revelação, cantor, poeta, influenciador e capa da GQ de maio. Uma aposta ainda silenciosa da TV, mas só até seu próximo trabalho estrear. “Ele é o cara mais estiloso do Brasil atualmente, esse é mais um de seus talentos naturais”, diz Cauã Reymond, de quem Jonathan se aproximou durante as filmagens de Reza a Lenda (2013) e para quem pede conselhos sobre tudo, da profissão à administração do dinheiro.

Levou o troféu de revelação no Domingão do Faustão e ganhou um amigo: “Entrei competindo com ele e saí de lá torcendo por ele. Queria de verdade que ele ganhasse”, diz João VicenteSelton Mello, que conheceu Jonathan em Meu Nome Não é Johnny (2008), filme em que ele participava como figurante, é outro que veste a camisa da Sociedade Esportiva Jonathan Azevedo. “Seu sucesso é fruto de uma vida dedicada ao que ele sempre sonhou. Além de um grande artista, também é um ser humano da melhor qualidade, que vai crescer muito!”

 

No restaurante carioca do momento, Jonathan segue pelo menu degustação como se fosse habitué. Mas a verdade é que ele experimenta foie gras pela primeira vez e pergunta tudo sobre todos os pratos. Não deixa de fotografar nenhum e posta no stories sob a arroba Negblack, com mais de um milhão e meio de seguidores. “O cara é uma esponja!”, diz Cauã. Pede a carta de vinhos, passa os olhos rapidamente por ela e se decide, porque sabe o que é bom: “Quero a harmonização, por favor”.

É a senha para mais um aprendizado: anota todos os nomes dos rótulos. Entre uma taça e outra, conta sobre a infância e os amigos de fora da comunidade. “Era tudo nosso, eu me sentia em casa no meio deles. Devia ter gente que pensava: ‘O que aquele neguinho tá fazendo com esses playboys?’ O Leblon queria me ver distante, mas eu sempre estive perto. Ipanema queria me ver na China, mas eu tava no Arpoador surfando. No caminho até a praia as madames me viam e abraçavam as bolsas.

O contraste social era tão grande quanto a proximidade que a gente tinha. Não havia como eu fugir deles, nem eles de mim.” Conta que estudou em escola particular graças a um movimento dos colegas de classe que pagavam mais para ter ele na escola. “O diretor falou bem assim: ‘Vocês não querem que ele estude com vocês? Então vocês vão pagar os estudos dele’.”

Aos 17 anos, descobriu que era filho adotivo. Começou em uma reunião de pais na escola na qual a professora não falou com sua mãe, Dona Cildéia. “Perguntei por que e a professora me respondeu com uma pergunta: ‘Mas aquela era sua mãe?’. Acho que ela percebeu que eu não sabia, mas não disse nada.” Logo depois, a mesma professora protagonizou uma cena reveladora. “Um dia eu estava com uns amigos playboys na porta da casa dela. Ela saiu bolada e falou: ‘Por que você não vai com esses meninos brincar lá na porta deles pra ver se vão deixar?’ Respondi: ‘Olha, seu filho vive na porta de casa e eu não falo nada’. O filho dela era da boca. E ela disse: ‘Primeiro vá descobrir quem é seu pai e quem é sua mãe, depois você fala do meu filho!’.”

Foi muita informação. Jonathan desmaiou na hora e acordou na cama dele, com a mãe sentada ao lado. “Aí ela me contou tudo: o filho dos meus pais adotivos tinha acabado de morrer e uma moça do hospital falou que uma mulher queria dar o filho. Meus pais aceitaram, contanto que eles não fossem nunca mais atrás do menino.” O que poderia derrubar muitos, só fortaleceu o garoto. “Conhecer a minha mãe de sangue não é o que me move. O que me move é correr atrás do meu sonho. É fazer uma obra na casa da minha mãe, montar uma biblioteca na comunidade, porque conhecimento muda a vida, e é transformador mostrar que sua vida mudou por causa do conhecimento.”

Jonathan Azevedo (Foto: Pedro Dimitrow)

À universidade chegou também com ajuda e bolsa. Treinava basquete nessa época e achava que o esporte traria seus sonhos mais para perto. Quando viu que era o único negro na faculdade de teatro, pensou em desistir. Mas ouviu de uma professora: “Você não vai aprender daqui pra fora, só daqui pra dentro”. Voltou para a sala de aula. A chave esporte-teatro virou durante um ensaio. “Fiz uma cena e o diretor falou: ‘Se tu quiser ficar rico, nunca saia do palco’. Meu treinador de basquete nunca tinha falado isso. Fiquei no teatro.”

Sorte dele e de quem o escalou para Ilha de Ferro, uma série sobre o universo dos embarcados nas plataformas de petróleo, protagonizada por Cauã Reymond e dirigida por Afonso Poyart. Um caso diz muito sobre Jonathan: logo que chegou para ficar uma semana em contato com os profissionais que trabalham nas plataformas, um deles, um português, não pareceu muito confortável com seu jeito despachado.

“A primeira coisa que fiz lá foi stories pro Instagram, para não perder nada na vida de negs”, conta. #VDN, sua hashtag pessoal, abrange tudo o que se passa na existência do ator e aponta para mais uma possibilidade: apresentador de televisão. Voltando ao português, Jonathan foi conquistando o cara. Carregava os equipamentos, tirava fotos com todos os funcionários e se mostrava como é. “Daí ele começou a me olhar de outra maneira.”

No meio dessa semana, foi seu aniversário. O portuga quis fazer um agrado. Descobriu que ele gostava do deck, no heliponto, queria ir lá, mas era proibido. Com o crachá mais credenciado entre todos, o português liberou o local para uma “festa surpresa” para ele. “Chorei muito, era um por do sol surreal. Foi minha primeira festa surpresa e foi quebrando mais uma barreira.” Detalhe: Jonathan se emociona facilmente e chora, mas chora muito. Chora quando fala dos pais, chora quando fala do trabalho, chora quando fala de qualquer coisa que o toca fundo. “É um cara muito espirituoso e muito sensível”, entrega Juliana Paes.
Rewind para aquela sexta-feira 13 em São Paulo.

Os flashes no backdrop do amfAR o fuzilam e já no interior dos domínios do empresário e host Dinho Diniz ele se mostra aparentemente tímido. Aparentemente. Bastam alguns minutos para fazer amizade com os bartenders, escolher o drinque que irá acompanhá-lo (“Mermão, bom demais esse moscow mule!”) e, ainda, distribuir sorrisos e cumprimentar quem o aborda porque o conhece “de vista”.  A certa altura, na mesa com executivos maravilhados com sua presença, ele pede mais um moscow mule e dá a ideia:

Jonathan Azevedo (Foto: Pedro Dimitrow)

“Não era nem para eu estar vivo. O Brasil tem tantos ‘não era’ e que se ampliam pro afrodescendente, pobre, favelado. Juntei todos os ‘não era’ e transformei no ‘eu posso’.” Cita o mito da caverna, de Platão. “Sabe aquele maluquinho que se acorrentou e ficou lá fora, viu tudo, a mata, o azul e voltou pra avisar aos amigos que tinha um mundo lá fora? Os amigos falaram: ‘Pô, mermão, tá passando tudo aqui na minha frente, você quer se aventurar nesse mundo tudo lá fora? Tenta a sorte lá que pra mim tá bom aqui’. E ele fala: ‘Sério mesmo que vocês vão ficar aqui? Respeito vocês, mas eu fui’.”

Naquela noite que passou aceso, antes de tirar um cochilo na primeira ponte aérea, o sabiá ainda iria piar e voar alto, subindo no palco com Seu Jorge para mandar uma rima improvisada e ser agraciado com beijos e carícias íntimas de damas da alta sociedade paulistana. Pega a visão: se for para resumir Jonathan Azevedo em dez páginas e muitos detalhes nas entrelinhas, está aí.

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